segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Antoni Gaudí


No fim do século XIX, Barcelona vivenciou um período de grande desenvolvimento econômico; era a única cidade espanhola na qual havia um princípio de desenvolvimento industrial. Essa situação favoreceu a geração de uma grande quantidade de pessoas migrando para a cidade em busca de trabalho e também possibilitou a formação de uma burguesia dinâmica, ligada à indústria e ao comércio, que procurava manifestar sua diferença em relação àquela burguesia central alienada pela tradição. A oposição ao centralismo espanhol também se deu com o Renaixença, um movimento catalão que reinvidicava sua autonomia política. Esses fatores econômicos, sociais, políticos e culturais permitiram então o advento do Modernismo na Catalunha (observação para o termo Modernismo usado na Espanha, sendo a nomenclatura usada para se designar à Art Nouveau, assim como também recebeu outras traduções na Alemanha – Jugendstil, e na Áustria – Secessão).
“Foi na Catalunha onde se rompeu o marasmo artístico, e ele não aconteceu casualmente. Essa ruptura, que recebeu o nome de Modernismo, está ligada ao novo ambiente social e cultural criado pela evolução econômica, os problemas políticos e regionais. (...) um movimento cultural que não se limitava às artes plásticas tradicionais, mas que se estendia também às chamadas artes decorativas, (...) que estava ligado a idéias sociais e filosóficas concretas e que ofereceu, dentro de uma base comum, diversidade de facetas e matizes.” (BOZAL, Valeriano. p. 21)

Nesse contexto nasceu Antoni Gaudí, um dos grandes nomes do movimento moderno da Catalunha. Formou-se arquiteto em 1878, e desde cedo buscou conhecimento na história de sua região. Sua construção regional também foi influência de Viollet-le-Duc, o qual defendia o uso de elementos construtivos do estilo nacional como decorrentes dos princípios do racionalismo estrutural.
“Apesar do forte crescimento econômico na região, registrava-se uma perda de influência política da Catalunha, que tinha um passado glorioso de que podia orgulhar-se. Sob o domínio dos Romanos, o país tinha se tornado um centro comercial importante, e, em 343, Barcelona passou a sede episcopal. Durando a Idade Média, era um condado independente com legislação e línguas próprias. Nos tempos modernos, a região perdia cada vez mais a sua independência. No início do século XIX, foi mesmo proibido uso da língua catalã nas escolas. A descoberta do gótico, nas últimas décadas do século XIX, era mais do que uma preocupação artística para os catalães: transformou-se num sinal político. Também Gaudí se juntou ao movimento nacionalista. (...) Gaudí fez-se membro do Centre Excursionista, um grupo de jovens que faziam peregrinações aos locais históricos do passado glorioso. Gaudí sentia-se catalão até a medula dos ossos. Foi nessas excursões que alargou seus conhecimentos sobre as grandes construções da sua terra natal. Nestas incluíam-se, além das grandes catedrais góticas (...) principalmente as construções dos Mouros, testemunhos do passado árabe na Espanha. Também nesse aspecto, não estava só; havia um grande número de pessoas interessadas nesse passado. Uma vez mais, bastante atrasada em relação ao resto da Europa, espalhava-se na Espanha o entusiasmo pelo exótico.” (ZERBST, Rainer. p. 17-18)

Além de Viollet-le-Duc, Gaudí abraçava também as influências de Ruskin. “O ornamento é a origem da arquitetura”, assim proclamava Ruskin em 1853. Três décadas mais tarde, seria Gaudí quem, de maneira semelhante, iria defender o ornamento, com todo o fervor que o caracterizava.
Suas obras começadas após 1900 demonstram mais as características da Art Nouveau, com formas assimétricas, curvas, derivadas da natureza, de produção única. Porém, suas primeiras obras, e logo a própria Casa Vicens, estão mais ligadas ao gótico.
“Situar Gaudí no Art Nouveau é relativamente fácil, se nos limitarmos ao seu trabalho posterior a 1903. Mas três anos antes ele iniciou o Parque Güell e cinco anos antes a Capela de Santa Coloma de Cervelló. Na capela não há linhas onduladas; tudo é agudo, anguloso e agressivo (...) Se procurarmos fazer comparações, devemos nos lembrar mais do expressionismo alemão dos anos 20 – nos sonhos fantásticos do Doutor Caligari – do que da Art Nouveau.” (PEVSNER, Nikolaus. p. 104)

A Casa Vicens, de 1883, é portanto uma obra que não exprime toda a genialidade de Gaudí, o qual ao longo de sua vida foi capaz de realizar com primazia outras grandes obras, com outras influências, como as casas Batló e Milá, o Parque Güell e a Sagrada Família, por exemplo. Entretanto, ela reúne características muito importantes que permitem analisar como o passado histórico da Espanha e como a cultura catalã foram fatores determinantes não só nos processos políticos no final do século XIX em Barcelona, mas também no processo artístico e social. Gaudí reflete nesse momento não apenas a questão nacionalista defendida por Viollet-le-Duc, buscando inspiração no gótico e na cultura mourisca, mas também a questão social e cultural da Catalunha, que buscava fervorosamente o seu reconhecimento como nação.

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